Redução da jornada de trabalho: por que parte do empresariado resiste ao fim da escala 6x1

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A reação do setor empresarial à proposta de redução da jornada de trabalho e ao fim da escala 6x1 revela um debate que vai muito além da competitividade internacional. Embora o discurso público insista na tese de perda de mercado, aumento de custos e insegurança diante de cenários externos, como o recente tarifaço, a resistência tem raízes mais profundas, estruturais e culturais.

O argumento da competitividade, frequentemente utilizado, parte de uma premissa simplificada: a de que trabalhar mais horas torna o país mais produtivo. No entanto, a experiência internacional demonstra o oposto. Economias altamente competitivas, como Alemanha, Holanda, Dinamarca e França, apresentam jornadas médias menores e maior produtividade por hora trabalhada. O diferencial não está no tempo de permanência no trabalho, mas na eficiência, inovação, tecnologia e organização produtiva.

Também não se sustenta a tentativa de associar a redução da jornada a riscos comerciais externos. Tarifas e barreiras internacionais são, essencialmente, instrumentos de barganha política e geopolítica, não consequência direta da carga horária dos trabalhadores. Usar esse cenário como justificativa para manter jornadas extensas é retórica defensiva, não análise econômica consistente.

O que está em jogo, de fato, é a preservação de um modelo produtivo que ainda depende fortemente da intensificação do trabalho humano. Em muitos setores, a baixa automação e o reduzido investimento em inovação fazem com que mais horas de trabalho sejam vistas como solução imediata para manter a produção. Reduzir a jornada exigiria reorganizar processos, investir em tecnologia e eficiência — mudanças estruturais que parte do empresariado ainda reluta em enfrentar.

Há, ainda, um componente cultural relevante. A escala 6x1 carrega uma lógica histórica de controle sobre o tempo do trabalhador, em que a presença constante é confundida com comprometimento e produtividade. Diminuir a jornada significa reconhecer que o trabalhador tem direito ao descanso, à vida social, familiar e ao próprio tempo, algo que desafia uma tradição autoritária nas relações de trabalho brasileiras.

Outro ponto pouco debatido é o impacto político dessa escala. Jornadas longas e extenuantes reduzem a capacidade de organização, participação social e mobilização dos trabalhadores, enfraquecendo seu poder de negociação. Não se trata apenas de economia, mas de correlação de forças.

O argumento do medo, de que a redução da jornada causaria desemprego, também não é novo. Foi utilizado contra férias, 13º salário, descanso semanal remunerado e jornada de oito horas. A história mostra que essas conquistas não destruíram a economia; ao contrário, ampliaram consumo, saúde, bem-estar e produtividade.

O debate sobre o fim da escala 6x1, portanto, não é ideológico nem irresponsável. Ele questiona qual modelo de desenvolvimento o Brasil deseja seguir: um baseado no desgaste humano e na ampliação do tempo de trabalho ou outro sustentado por inovação, eficiência e valorização da vida.

Resistir à mudança pode parecer confortável no curto prazo, mas insistir em um modelo ultrapassado cobra um preço alto para o social, econômico e humano. O futuro do trabalho não se constrói com mais horas, mas com mais inteligência produtiva e respeito ao tempo de quem trabalha.

Por Margaret Paim - Jornalista 


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