Energia

'A matriz energética precisa ser diversificada', diz Cleverson Siewert

Após seis anos à frente da Celesc, Siewert anunciou que vai deixar o cargo. Segundo ele, geração distribuída é o futuro da energia elétrica em SC


Rede Catarinense de Notícias - A Celesc destinou mais de R$ 35 milhões para projetos de eficiência energética. Qual a avaliação dos investimentos desse segmento?

Cleverson Siewert - A gente lançou mais umas etapas de programas bastante importantes. A Celesc, a partir de 2012, quando nós assumimos a gestão, tinha uma pendência com o órgão regulador que era a execução desses projetos, porque isso é uma obrigação regulatória. Nós temos que investir recursos anualmente nesses processos. A gente tinha dificuldade em relação a isso. Então, nós desenvolvemos uma área aqui dentro e lotamos de pessoas que pudessem executar esses projetos para nós. A partir dali, então, uma série de inovações aconteceram. A primeira importante delas foi a gente entender que nós queríamos democratizar o uso desses recursos, fazer com que eles possam chegar ao maior número de pessoas, assim como em áreas mais necessitadas. E aí uma série de novos projetos foram estabelecidos nas nossas várias classes de consumo. E, de fato, esses projetos foram bastante vitoriosos. A gente teve em 2015, 2017 e 2018, projetos escolhidos como os melhores do Brasil. O que traz então esse protagonismo da Celesc nesse cenário. Em 2015 nós ganhamos o melhor projeto do Brasil com o projeto Bônus Eficiente, que é aquele projeto de troca de eletrodomésticos com 50% de desconto. Em 2017, o projeto foi o Bônus Fotovoltaico, que financiou 1.250 telhados solares para clientes nossos, também com bônus. E agora, em 2018, o Bônus Motor, que foi para as indústrias, troca de motores e tal. A forma de fazer, o protagonismo nosso vem disso, um empenho bastante grande da nossa equipe e mostrar que a gente pode fazer para todas as classes de consumo um sentimento absolutamente diferenciado.

RCN - A Fiesc divulgou uma pesquisa que aponta que a vida média das máquinas e equipamentos da indústria catarinense é maior em comparação com outros lugares. Como você enxerga o consumo de energia elétrica no setor industrial, que é o que mais consome?

Siewert - Sim, a indústria consome 30% da energia em Santa Catarina. A gente lançou esse programa Bônus Motor em parceria com a Fiesc, justamente por conta disso. A Fiesc fez uma pesquisa com todos os associados e essa pesquisa trouxe umas informações interessantes. Estava começando a se criar uma cultura da gestão da energia na indústria catarinense, ou seja, profissionais vinculados especificamente a um entendimento do consumo da energia e qual a melhor hora de fazer, de quais equipamentos deveriam utilizar e quando deveria ser a troca desses equipamentos. Por isso, eu achei um trabalho muito interessante. Por outro lado, essa pesquisa também apontava que faltavam fontes de financiamento. Os industriais sabiam que isso era importante, que poderia trazer retorno para eles. Via de regra, quando você eficientizar a fábrica, a casa, o comércio, qualquer coisa, você tem de 15% a 20%, ou até 30% de economia de energia mensal, só que não tinha quem financiasse. Então a Celesc criou essa linha Bônus Motor para ir ao encontro do industrial catarinense e ter uma linha de financiamento para ele, a juro zero, com custo praticamente inexistente nesse sentido. Então fizemos esse projeto em conjunto. A Fiesc, de uma forma geral, sempre foi um protagonista em Santa Catarina gerando emprego e renda. Naturalmente as suas demandas, os seus entendimentos, sejam qualidade de energia ou seja a eficientização da questão energética, é prioridade para nós. A gente entende isso como uma parceria muito bacana. Funcionou e queremos ampliar para novos negócios.

RCN - 2018 foi um ano muito marcante na história brasileira. Para a Celesc, pode ser considerado um ano bom?

Siewert - Eu penso que sim. 2018 foi um ano bem importante para a Companhia. A gente consolidou esse ano uma série de encaminhamentos feitos ao longo desses últimos oito anos. Se eu pudesse olhar para trás e ver o que aconteceu, acho que houve convergência de esforços. Todos aqueles que interagem com a Companhia, desde os acionistas, passando pelo Conselho de Administração, pela diretoria executiva, movimento sindical, todo mundo está olhando para o mesmo lado. Esse ano a gente conseguiu manter a mesma prática. Isso é fundamental. Segunda coisa importante é sobre investimentos. A gente, pelo menos nos últimos cinco anos, tem feito R$ 300 milhões de investimentos anuais. Esse ano até foi mais do que isso. Isso permitiu que nós tivéssemos nossos indicadores técnicos, que é nossa quantidade de horas sem energia e quantidade de vezes sem energia serem reduzidos em 40% de 2011 para cá. Isso é um ganho de produtividade gigantesco. Eu falei de obras, de tecnologia na rede. Mas há também mais gente disponível. A gente botou mais eletricistas para dentro, frota renovada. A empresa está bastante coerente nesse sentido. Por outro lado, investimentos na área comercial. São R$ 50 milhões anuais em investimento nos últimos cinco anos. Aqui na área comercial, o nosso grande desafio é entender a necessidade do cliente, fazer com que nós tenhamos uma aproximação cada vez maior do cliente. E o grande exemplo é ter trazido para as redes sociais, para a internet, todo o atendimento que a gente fazia nas lojas físicas. Há quatro anos isso não existia. Hoje, 65% de todo o atendimento da empresa, todos os nosso clientes que nós atendemos, 65% é no meio digital. Então, naturalmente, isso traz mais comodidade, conforto, seja para quem vai procurar uma loja física, seja para quem pode fazer no meio digital. Eu diria um terceiro ponto é a comunicação melhorada. A percepção sobre a empresa, tanto interna, com os funcionários, quanto externa, para a sociedade. É uma empresa que todo mundo vê com um alto grau de governança, e quando a gente fala em governança, começa lá atrás, com mudança do nosso estatuto social. Esse estatuto social exigiu um plano diretor: fizemos esse plano diretor para enxergar a empresa até o ano 2030. É um plano que tem metas físicas, financeiras, metas de sustentabilidade, tudo muito bem estabelecido. Esse plano diretor nos remeteu a novos negócios, assim como plano de eficiência operacional. Igual à iniciativa privada: fazer mais com menos. Temos que ser mais ativos, racionalizar processos, melhorar processos. Fizemos isso também. E o que foi mais interessante foi que nós pegamos tudo isso e amarramos naquilo que é mais importante para qualquer ser humano, que é o bolso. A gente estabeleceu uma métrica de meritocracia. E quando isso aconteceu, os resultados vieram, ao longo desses anos todos. 2018 não foi diferente. Governança é um ponto. Transparência também. Então nós temos toda uma métrica de controle estabelecidos de formas muito objetivas, claras, transparentes. Por último, uma boa gestão. A Celesc tem trazido bons resultados, tanto do ponto de vista técnico quanto do ponto de vista econômico-financeiro. Claramente, o caminho que a empresa está seguindo é um caminho coerente. Agora, precisamos acelerar o passo. Precisamos ainda fazer alguns ajustes, é natural. Reclamações existem, e a gente precisa estar atento e evoluir. Claramente, nós temos um caminho bem seguido, bem trilhado. E o que a gente precisa é continuar nessa mesma linha.

RCN - Santa Catarina conta com uma matriz basicamente de hidrelétricas, mas avança em outras fontes. Como você o cenário de geração de energia em Santa Catarina hoje?

Siewert - O parque gerador brasileiro é um parque limpo, diferente do restante do mundo. A gente tem cerca de 80% da nossa matriz limpa, 70% hídrica. O problema é esse: apostar todas as fichas em um único processo. Quando falta chuva, e infelizmente a gente tem passado por isso, se tem um aumento do custo da energia: precisa acionar as térmicas, que são mais caras. Acho que a matriz é coerente, mas precisa ser mais diversificada. É nesse sentido que Santa Catarina precisa atuar. O que a gente enxerga claramente é sol, a geração solar é fundamental, a geração eólica é fundamental, e eu diria que a geração distribuída, que é você, na tua casa, poder fazer a tua geração. É um caminho do futuro não só para geração, como para as próprias distribuidoras. As distribuidoras precisam pensar de forma estratégica daqui para frente. São três as lógicas: primeira é a digitalização, serviços cada vez mais inteligentes e conectados. Segundo, a descarbonização, trazer um parque de geração cada vez mais limpo. E o terceiro, é a descentralização, ou seja, a geração na sua casa. Hoje, o Brasil como um todo ainda é incipiente nesse processo, mas a tendência de crescimento é bastante grande. Nós somos o segundo estado do Brasil em geração distribuída já em quantidade de conexões realizadas. Nós fizemos o maior projeto do Brasil em geração distribuída, que foram 1.250 painéis solares em unidades consumidoras com 60% de desconto. A Engie já deu um passo nesse sentido, outras distribuidoras já deram um passo nesse sentido. Acho que a Celesc também pode buscar alguma coisa nessa linha. A geração distribuída é um caminho natural para isso.

RCN - Como tornar a geração distribuída mais popular?

Siewert - Eu acho que tem desafio para todo lado. Um desafio para a distribuidora é entender como essa nova matriz vai funcionar. Porque a partir do momento que você tem geração distribuída espalhada no Estado todo... Hoje, para fazer manutenção, você desliga a rede, e trabalha com a linha morta, desligada. A partir do momento que tiver geração distribuída, eu posso desligar a rede, só que ainda vai estar vindo energia vinda da residência, então eu vou precisar mudar minha forma de trabalhar, passar a trabalhar com linha viva. As pessoas vão trabalhar com os cabos energizados. Isso é muito mais caro, muito mais difícil. Existe um custo inerente à distribuidora por conta desse processo. Esse é um desafio. Mas, a gente não pode negar que isso vai acontecer, então a gente tem que estar preparado para isso. Por outro lado, fomentar também essa nova lógica porque pode ser um bom negócio para nós. A sociedade, por outro lado, já está percebendo que o payback de um residência média aqui em Santa Catarina, que já foi de 20 anos, hoje é de cinco ou seis anos. Então o custo dessa implantação está cada vez mais baixo, e naturalmente as pessoas vão estar procurando cada vez mais isso. Financiamento sempre vai ser um ponto importante. Hoje, tem uma série de instituições estão dando financiamento para essa frente. Para mim, é uma questão cultural. E o terceiro desafio é do governo. Nós temos aí o benefício da redução do ICMS. O Brasil todo já tomou, aqui em Santa Catarina, o governador Eduardo Moreira também assinou o protocolo, só que ainda precisa passar pela Alesc. Então existe um desafio que é a aprovação dessa lei efetiva para que possa começar a ser aplicada. Então Santa Catarina ainda tem um 'problema', digamos assim, porque o ICMS ainda é cobrado dessa relação. A Alesc anunciou que na retomada dos trabalhos vai fazer esse encaminhamento. Então acho que essas três vertentes, distribuidora, governo e sociedade, vão se acomodar para que isso possa se fomentado de forma cada vez mais efetiva, cada vez mais forte daqui para frente.

RCN - Você já anunciou sua saída da Celesc, no final do ano. Qual a principal mudança nesse período? Qual é o seu legado?

Siewert - Eu acho que é o trabalho. As pessoas compreenderam que, com trabalho e dedicação, é possível fazer a transformação. Acho que eu, de todos os dias que eu estive aqui dentro, cheguei tarde e saí cedo. Trabalhava sábado, domingo, à noite, feriado, porque eu gosto de fazer o que eu faço e isso e, sem sombra de dúvida, fez com que a empresa pudesse confiar em mim, e um nos outros. Com isso, os resultados puderam acontecer. Acho que essa mensagem é de dedicação e de comprometimento, mostrando que mesmo sendo público e com todas as burocracias e dificuldades existentes, a gente pode fazer. O reconhecimento veio por conta disso. Isso pra mim é muito bacana, eu saio muito satisfeito, muito honrado.

RCN - Gostaria de deixar uma mensagem neste momento de saída?

Siewert - Eu acho que a minha mensagem é que Santa Catarina é um Estado absolutamente diferenciado, que tem grandes potencialidades e a energia é algo é fundamental. Eu sempre digo: energia elétrica é fator de competitividade, de desenvolvimento. É item fundamental no nosso dia a dia para geração de emprego e renda e melhoria para a qualidade de vida. A Celesc procurou ao longo dos últimos anos trabalhar sempre a contento nesse sentido, buscando otimizar as suas ações para deixar as empresas, as pessoas terem esse meio, esse produto da melhor forma possível. Saio feliz, orgulhoso do resultado que a gente alcançou, com objetivos bastante claros, definidos, e tenho certeza de que vão ser seguidos pela próxima gestão que aqui tiver. Eu acho que estamos na vanguarda em termos tecnológicos e de serviços e espero que o futuro possa continuar na mesma toada.


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